Os valores e a mensagem

«Cavaleiro e André Gomes estiveram na equipa principal. Cancelo e Bernardo Silva foram crescer para grandes clubes. Não tinham espaço na equipa principal e não poderiam ir para a equipa B. Os jogadores têm cláusulas no contrato. Imagine que há uma proposta para vender um jogador, por 15 milhões de euros, que vem da formação e nunca foi titular. Não somos maus gestores e não podemos ignorar isso...» - Luís Filipe Vieira (14/08/2014).

Aquando da entrevista que o Presidente do Benfica deu à BTV logo no início da presente temporada, muitos foram os que deduziram que nem todos os jovens que o clube encarnado emprestara no mercado de Verão regressariam à Luz no final da época. A contratação a título definitivo de Bernardo Silva, pelo Monaco, confirmou esse cenário. Se por um lado é legítimo questionar as condições de empréstimo de um dos maiores talentos puros dos últimos anos na formação do Seixal, é igualmente válido confrontar esta venda com as oportunidades que o médio (não) teve na formação principal e as mensagens de aposta na formação veiculadas por treinador e Presidente do clube.

Analisando o valor monetário, 15,75 milhões de euros é, de facto, uma quantia impressionante, tendo em conta que o jogador quase não se exibiu no plantel principal dos encarnados. A questão que aqui se coloca, e que é igualmente válida para os casos de André Gomes, Ivan Cavaleiro ou João Cancelo, é saber se é preferível encaixar cerca de 15 milhões de euros por atletas promissores nesta altura das suas carreiras, quando ainda nem se afirmaram no plantel principal, ou deixar escapar esta oportunidade, correndo o risco de não haver propostas iguais ou superiores a estas. Pessoalmente, julgo que os contornos do negócio de Bernardo Silva não foram os melhores. O jovem criativo possui uma técnica pouco comum entre os jogadores portugueses que ocupam a sua posição e seria capaz de render um encaixe superior ao Benfica, caso fosse vendido daqui a uns anos. Mas aqui surge um novo dilema - oportunidades. O Bernardo não é um jogador na senda de um Witsel ou de um Enzo, nem possui características que se encaixem perfeitamente no papel de avançado recuado (ou 2º avançado) que Jorge Jesus tanto gosta de usar. Uma equipa não joga apenas com um sistema táctico, mas haverá sempre um com uma certa primazia. E estagnar a evolução de um jogador não seria o melhor para o clube, nem para a Selecção. Em suma, devo admitir que "aplaudi" o empréstimo do jogador, desde que não houvesse uma cláusula de opção de compra envolvida. E as razões eram exactamente as que motivaram o Monaco a efectuar a transferência - o clube vive o seu melhor momento da época, o jogador está a mostrar todo o seu potencial e a ser uma peça-chave no esquema dos monegascos e, "como 1+1=2", o clube do Principado resolveu apostar na sua contratação antes que houvesse uma valorização ainda maior ou outros clubes europeus demonstrassem interesse e estivessem dispostos a esbanjar mais dinheiro.

Igualmente interessante de se analisar é a mensagem que esta transferência transmite, principalmente quando confrontada com o discurso de Luís Filipe Vieira. A aposta na formação tem de ser feita de forma gradual, é certo. Não se pode esperar que o Benfica apresente um onze inicial com 7/8 elementos da formação de um momento para o outro, até porque a valorização de jogadores estrangeiros também permite encaixes importantes. E, por vezes, os empréstimos de jovens promessas, portuguesas ou não, surtem o efeito desejado (veja-se o caso de Rodrigo, por exemplo). Mas vender - ou emprestar com opção de compra - jogadores da formação com valia suficiente para merecerem mais minutos pela equipa principal, e aliar isso a um discurso que prioriza a oportunidade de negócio sobre a capacidade exibicional do atleta, suscita, muito provavelmente, algumas incógnitas em torno dos jovens do Benfica (e dos adeptos). O "mundo do futebol" é um mundo de negócios. Quer se queira, quer não. Mas de que vale ter excelentes resultados nos escalões mais jovens se depois não existe uma aposta nos patamares seguintes? Conseguir bons encaixes é importante, claro, mas essa não pode ser a mensagem transmitida. Há jogadores da formação nacional com bastante qualidade, porém, à semelhança de todos os outros, também precisam de ritmo competitivo, de oportunidades e de confiança para a poderem exibir. E se no futuro permitirem uma boa venda, melhor.
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